Samuel Fernandes
Neutro
DEIXE-ME ENTRAR
>quando eu nasci eu não fui batizado
>desde 2013 tento encontrar um motivo
>esse parece o único lógico
>por isso eu atraio tantas coisas estranhas
>desde pequeno as mesmas coisas
>barulhos pela casa
>vultos em cantos
>sombras de objetos que não existem
>cachorros latem pro vazio ao meu lado
>isso se tornou tão frequente na minha vida que eu já ignorava
>dos 7 até os 17 ignorando
>acreditava que tudo isso era da minha imaginação
>acreditava
>Século 2013
>21:00 horas
>meus pais tinham acabado de sair de casa
>foram jantar com uns amigos
>sempre voltavam tarde
>01:00 da manhã ou mais tarde ainda
>ficar sozinho em casa é sempre bom
>principalmente em noites de chuva
>qualquer adolescente de 17 anos sabe disso
>coloquei meu jantar no prato
>me sentei na sala
>minha cachorra do lado esperando qualquer pedaço de comida cair
>liguei a tv
>hbo
>"Jogos Mortais 3"
>vai ser esse mesmo
>comecei a comer e a ver o filme
>13 minutos de filme
>escuto um barulho
>como se fosse alguem batendo na porta
>olho pra minha cachorra
>ela nem se moveu
>ainda me olhava sem desviar os olhos, esperando comida
>olhar pra minha cachorra quando ouvia algum barulho era quase um ritual
>se ela não ouviu o barulho era algo vindo da minha cabeça
>minha "imaginação"
>voltei a ver o filme
>14 minutos de filme
>mais uma vez o barulho
>mais alto
>definitivamente tinha alguem na porta
>morava em apartamento
>vizinho querendo reclamar da altura do filme?
>correspondência?
>conta de condôminio?
>coloco a comida na mesa de centro
>vou até a porta
>abro
>não tinha ninguém lá
>era o hall do andar, o elevador e meu tapete de entrada
>"slide to unlock" (deslize para destravar)
>humor dos meus pais sempre foi péssimo
>fechei a porta
>voltei pro sofa
>minha cachorra tinha subido no sofa
>comia a minha comida
>eu abri a boca pra mandar ela sair quando bateram na porta de novo
>percebi orelha da cachorra se mexer
>não tirou a cara do prato
>mas levantou a orelha
>ouvir ela ouviu
>alguem tava de sacanagem comigo
>abri a porta
>dessa vez tinha alguém lá
>em cima do meu tapete de entrada tinha uma criança
>tinha uns 6/7 anos
>batia na minha cintura
>sempre estive acostumado com sombras e vultos
>mas isso era bem mais que uma sombra
>cabelo
>um vestido rosa com branco
>sapatos brancos
>sombras e vultos não tinham cor
>eu gelei e travei por uns 3 segundos
>ela olhava pro chão
>os pés virados pra dentro
>braços colados no corpo
>molhada
>essa menina devia estar atrás de outro apartamento
>subiu sozinha e se perdeu pelos andares
>era a única explicação lógica já que não era minha mente
>abri a boca pra falar mas ela falou primeiro
>"Posso entrar?"
>uma parte de mim quase disse que sim
>mas era uma criança
>que ia entrar no meu apartamento
>imagina se alguém vem atrás dela
>encontra uma criança na minha casa
>"Aqui é o terceiro andar menina, você tá no andar certo?"
>"eu quero entrar, deixa eu entrar?"
>a situação já era estranha
>quando ela ignorou meu comentário ficou mais estranha ainda
>sabe quando você sente que alguma coisa ta errada?
>quando você não sabe explicar mas algo ta errado?
>era eu naquele momento
>aquela menina olhando pro chão
>com seus pés virados pra dentro
>ela era a definição de: algo errado
>"Você tem algum número que eu possa ligar?"
>"Eu queria entrar"
>"Você não pode entrar"
>ela levantou a cabeça
>seus olhos eram pretos
>totalmente pretos
>como se isso não bastasse ela ainda disse
>"prometo me comportar dessa vez"
>eu senti uma vontade de vomitar absurda
>frio no corpo todo
>pernas tremendo
>eu fechei a porta com força e tranquei
>uma volta na chave pra sair logo dali
>isso era um novo grau de imaginação
>ela bateu de novo na porta
>alto
>cada vez mais alto
>olhei pra minha cachorra e percebi ela correndo
>indo pro quarto
>se enfiando embaixo da cama
>ela tava ouvindo
>eu não estava imaginando
>peguei meu celular
>as batidas eram tao fortes que pareciam que a porta ia quebrar
>liguei pro meu pai
>nunca demorou tanto pra alguem atender o celular
>a porta ia cair e ele ainda não ia ter atendido essa merda
>foram os 10 segundos mais longos da minha vida
>quando ouvi o "fala filho" do outro lado da linha quase chorei
>mas eu chorei de verdade com o que ele disse em seguida
>"Que barulho é esse?"
>definitivamente não era minha imaginação
>de um lado a porta estalando com as pancadas
>do outro meu pai gritando perguntando o que tava acontecendo
>entre o choro gritei "Você nunca vai entrar aqui"
>e como tudo começou tudo acabou
>pararam de bater na porta
>eu ouvi como se fosse alguem resmungando do outro lado
>uma mistura de "tá" e "eu não entro"
>passei o resto da noite esperando no canto da sala meus pais voltarem
>todas as luzes da casa ligadas
>meus pais chegaram em casa alguns minutos depois
>quando entraram eu olhei pro lado de fora
>procurando alguma coisa fora do normal
>não encontrei nada
>depois do choque pesquisei na internet sobre o que aconteceu
>ao que tudo indica crianças como essa menina são vistas desde 1990
>já foram capturadas em videos
>fotos
>tem até uma pagina na wikipeia falando delas
>eu nunca soube explicar o que aconteceu
>não sei se é minha imaginação
>não sei se vultos e sombras são reais
>só sei que minha mãe me perguntou por que aquela noite o tapete da porta estava virado de cabeça pra baixo
>e sei que agradeço por não ter deixado ela entrar
>quando eu nasci eu não fui batizado
>desde 2013 tento encontrar um motivo
>esse parece o único lógico
>por isso eu atraio tantas coisas estranhas
>desde pequeno as mesmas coisas
>barulhos pela casa
>vultos em cantos
>sombras de objetos que não existem
>cachorros latem pro vazio ao meu lado
>isso se tornou tão frequente na minha vida que eu já ignorava
>dos 7 até os 17 ignorando
>acreditava que tudo isso era da minha imaginação
>acreditava
>Século 2013
>21:00 horas
>meus pais tinham acabado de sair de casa
>foram jantar com uns amigos
>sempre voltavam tarde
>01:00 da manhã ou mais tarde ainda
>ficar sozinho em casa é sempre bom
>principalmente em noites de chuva
>qualquer adolescente de 17 anos sabe disso
>coloquei meu jantar no prato
>me sentei na sala
>minha cachorra do lado esperando qualquer pedaço de comida cair
>liguei a tv
>hbo
>"Jogos Mortais 3"
>vai ser esse mesmo
>comecei a comer e a ver o filme
>13 minutos de filme
>escuto um barulho
>como se fosse alguem batendo na porta
>olho pra minha cachorra
>ela nem se moveu
>ainda me olhava sem desviar os olhos, esperando comida
>olhar pra minha cachorra quando ouvia algum barulho era quase um ritual
>se ela não ouviu o barulho era algo vindo da minha cabeça
>minha "imaginação"
>voltei a ver o filme
>14 minutos de filme
>mais uma vez o barulho
>mais alto
>definitivamente tinha alguem na porta
>morava em apartamento
>vizinho querendo reclamar da altura do filme?
>correspondência?
>conta de condôminio?
>coloco a comida na mesa de centro
>vou até a porta
>abro
>não tinha ninguém lá
>era o hall do andar, o elevador e meu tapete de entrada
>"slide to unlock" (deslize para destravar)
>humor dos meus pais sempre foi péssimo
>fechei a porta
>voltei pro sofa
>minha cachorra tinha subido no sofa
>comia a minha comida
>eu abri a boca pra mandar ela sair quando bateram na porta de novo
>percebi orelha da cachorra se mexer
>não tirou a cara do prato
>mas levantou a orelha
>ouvir ela ouviu
>alguem tava de sacanagem comigo
>abri a porta
>dessa vez tinha alguém lá
>em cima do meu tapete de entrada tinha uma criança
>tinha uns 6/7 anos
>batia na minha cintura
>sempre estive acostumado com sombras e vultos
>mas isso era bem mais que uma sombra
>cabelo
>um vestido rosa com branco
>sapatos brancos
>sombras e vultos não tinham cor
>eu gelei e travei por uns 3 segundos
>ela olhava pro chão
>os pés virados pra dentro
>braços colados no corpo
>molhada
>essa menina devia estar atrás de outro apartamento
>subiu sozinha e se perdeu pelos andares
>era a única explicação lógica já que não era minha mente
>abri a boca pra falar mas ela falou primeiro
>"Posso entrar?"
>uma parte de mim quase disse que sim
>mas era uma criança
>que ia entrar no meu apartamento
>imagina se alguém vem atrás dela
>encontra uma criança na minha casa
>"Aqui é o terceiro andar menina, você tá no andar certo?"
>"eu quero entrar, deixa eu entrar?"
>a situação já era estranha
>quando ela ignorou meu comentário ficou mais estranha ainda
>sabe quando você sente que alguma coisa ta errada?
>quando você não sabe explicar mas algo ta errado?
>era eu naquele momento
>aquela menina olhando pro chão
>com seus pés virados pra dentro
>ela era a definição de: algo errado
>"Você tem algum número que eu possa ligar?"
>"Eu queria entrar"
>"Você não pode entrar"
>ela levantou a cabeça
>seus olhos eram pretos
>totalmente pretos
>como se isso não bastasse ela ainda disse
>"prometo me comportar dessa vez"
>eu senti uma vontade de vomitar absurda
>frio no corpo todo
>pernas tremendo
>eu fechei a porta com força e tranquei
>uma volta na chave pra sair logo dali
>isso era um novo grau de imaginação
>ela bateu de novo na porta
>alto
>cada vez mais alto
>olhei pra minha cachorra e percebi ela correndo
>indo pro quarto
>se enfiando embaixo da cama
>ela tava ouvindo
>eu não estava imaginando
>peguei meu celular
>as batidas eram tao fortes que pareciam que a porta ia quebrar
>liguei pro meu pai
>nunca demorou tanto pra alguem atender o celular
>a porta ia cair e ele ainda não ia ter atendido essa merda
>foram os 10 segundos mais longos da minha vida
>quando ouvi o "fala filho" do outro lado da linha quase chorei
>mas eu chorei de verdade com o que ele disse em seguida
>"Que barulho é esse?"
>definitivamente não era minha imaginação
>de um lado a porta estalando com as pancadas
>do outro meu pai gritando perguntando o que tava acontecendo
>entre o choro gritei "Você nunca vai entrar aqui"
>e como tudo começou tudo acabou
>pararam de bater na porta
>eu ouvi como se fosse alguem resmungando do outro lado
>uma mistura de "tá" e "eu não entro"
>passei o resto da noite esperando no canto da sala meus pais voltarem
>todas as luzes da casa ligadas
>meus pais chegaram em casa alguns minutos depois
>quando entraram eu olhei pro lado de fora
>procurando alguma coisa fora do normal
>não encontrei nada
>depois do choque pesquisei na internet sobre o que aconteceu
>ao que tudo indica crianças como essa menina são vistas desde 1990
>já foram capturadas em videos
>fotos
>tem até uma pagina na wikipeia falando delas
>eu nunca soube explicar o que aconteceu
>não sei se é minha imaginação
>não sei se vultos e sombras são reais
>só sei que minha mãe me perguntou por que aquela noite o tapete da porta estava virado de cabeça pra baixo
>e sei que agradeço por não ter deixado ela entrar